ERA TARDE


Da memória a estrada,

o céu, o mar,

o fim do caminho

o voo rasante no abismo.


Da noite a ânsia,

o medo, a sede, o vinho,

a mão fria no rosto febril,

a flor murcha na lapela.


Da cama o cheiro,

o fogo, o som,

o carpir da alma amarrotada,

o cigarro aceso na boca molhada.


Era tarde. Tão tarde

que os uivos da serra

pareciam-nos demasiado perto

e o bater do relógio ensurdecia-nos.


E havia o quarto,

a gaveta cheia de amuletos guardados,

a porta encostada para o desconhecido.


No poema gemiam feridas abertas,

desamores em carne viva. Tão viva,

que parecia existir.



Francisco José Rito

imagem de António Borges da Silva




Sem comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pela visita. Este espaço é seu. Use e abuse, mas com respeito, principalmente por quem nos lê. Francisco