TROVA DO SOL POENTE


Cai o sol no mar e eu à deriva.

As vagas são tranças de cabelos ruivos

que me convidam a despenteá-las.


Lençóis de sal e de sargaço cobrem-me os pés,

a atiçar-me esta vontade louca

de me atirar de cabeça para todos os cantos do mundo.


Porque eu trago em mim a fúria das marés,

a tristeza de todas as partidas

e a alegria do barco a entrar a barra.


É poente o sol no mar de Setembro

e as gaivotas rendilham as falésias.

Eu solto-me do cais e navego o barco que sou,

pelo mar que sou, sem remos e sem norte.


Hei-de sequestrar este mar

e todas as paixões que ele encerra.

sangrar-lhe os mil segredos e bebê-los todos, um a um.

Sorver o amor que lhe escorre das entranhas

e se enrola na areia,

embriagando as conchas e os búzios

e os corpos nus dos amantes sedentos.


Hei-se fazer amor com este mar,

dominá-lo e servi-lo, ser seu amo e seu servo.


Aqui farei castelos, para que o mar os derrube

e me arraste no turbilhão de todos os sentidos.


Aqui me afogarei,

para que venha a vida, a beijar-me os lábios roxos

e a purgar-me a alma atormentada.


Aqui me livrarei dos dissabores.

Aqui vomitarei todas as dores!


Quebrarão as ondas

e lavar-me-ão dos medos.

E o mar há-de cantar-me embalos

de esperança e liberdade.


poema de Francisco José Rito

ilustrado por Camilo Rego




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