TRAVESSIA

Alma amortecida. Ego naufragado
nas profundezas de uma garrafa meio vazia.
Salvador de anjos, em pele de demónio.
O último suspiro do sonho amordaçado.
O latir do homem abandonado pelo cão.

O mundo colapsou no adro da igreja.
Praguejam os fiéis, oram os ateus.
Virgens prostituídas. Putas beatificadas.
Beatas ungidas com gotas de cio.
Maldições proferidas em nome de um deus menor,
sentado ao colo do recém-nascido.

Mas tu, senda azul na vã quimera,
boca em botão de rosa – beijada,
alma em botões de espinhos – rasgada,
vestirás as cores da nova primavera
árvore triunfal de altivo porte –
que não lamenta a vida ou teme a morte,
se antes morrer de pé, que viver prostrada!

poema de Francisco José Rito
fotografia de Adriano Coutinho


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