QUANDO EU NASCI


Quando eu nasci

os dias eram curtos

e as noites frias.


A minha terra cheirava a sal

e à flor do pinho verde.

Os peixes saltavam na ria.

O gado pastava nos campos.

Os melros assobiavam

nas laranjeiras floridas,

os lírios floriam ao sol pálido

e as rãs rouquejavam nos pastos humedecidos.


Quando eu nasci

o mundo não pasmou de curiosidade.

Nem o comboio que atravessa a minha aldeia descarrilou,

nem as Trindades se ouviram fora de horas.


Foi um segundo igual a tantos outros:

A mãe inventava um ror de preces novas

O pai amolava a gadanha por demais afiada,

para dissimular o desassossego.

e eu… eu desdobrava-me em estrebuchos,

queixumes e gritos, a avisar que cheguei

(como se quem pare não soubesse que pariu).


Nasci num segundo igual a tantos outros,

de um dia que permaneceu igual a tantos outros.

Só o teu coração dilatou

para me acolher, Mãe.


texto de Francisco José Rito

imagem de Jorge Bacelar






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