A VIDA FAZ-SE DE BRAÇOS


A estrada que percorria

para ir aprender a desenhar ideias novas

era um desfiar de silêncios

ou de ladainhas roucas


As mães

debruçadas nos muros caiados das casas térreas

pareciam-me todas da mesma cor

do mesmo tamanho e da mesma idade


Nos recados também se assemelhavam

palavras sábias e certeiras

como os ponteiros do relógio da igreja

as marés ou as luas


Por vezes o arado rasgava a leiva

ali, mesmo à minha frente

e era como se a terra se esvaísse em frutos

parindo em chorrilhos de abundância


Noutros cantos

apregoava-se o pão roubado às vagas

preces cantadas com a mesma fé

com que se levava o barco ao mar

ou os filhos aos pés da virgem


E nesse vaivém de rituais

aprendi que a vida faz-se de braços

tanto como de abraços


Sobre os homens, aprendi

que são os pais que os fecundam

mas são as mães que os constroem


Ainda hoje me encontro

na memória daqueles olhares todos iguais

e desenho ideias novas 

nos muros caiados das casas térreas

à procura do poema perfeito.


Francisco José Rito





Sem comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pela visita. Este espaço é seu. Use e abuse, mas com respeito, principalmente por quem nos lê. Francisco