CALAI-VOS

Calai para sempre
essa rouquidão de sussurros cavos .
Calai as palavras caras
que compõem poemas nunca por vós lidos.
Calai essa vontade
de explicar o inexplicável;
de consolar o inconsolável.
Calai-vos!
Deixai-me ouvir
o choro do mar revolto em pranto
e a voragem enfurecida
que me arrasta para dentro de mim,
onde tudo é breu e gélido e desalegre.
Eu hoje quero celebrar a mágoa.
Comemorar a graça de morrer.
Sofrer a dor dos dias arrastados
em que os corvos me aguardam, inquietos.
Deixai-me acariciar a morte.
Postular dores nunca sofridas
e recordar a hora apaixonada
de o ver arrancado dos meus braços
e da felicidade feito o pântano,
onde as saudades afogam, em surdina.
E tu, meu rio de ternura, meu deleite,
tu, que foste enigma em livro aberto,
fugaz vivedor das histórias só tuas;
deixa ficar comigo os teus segredos
como a lua deixa a luz nas pedras nuas.
Francisco José Rito



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