QUANDO ELA PASSA

Quando ela passa,
passa o esplendor e a graça
da mulher de palmo e meio
que caminha à beira-mar
nas tardes de soalheiro.
Passa a mulher portuguesa!
Rebola o braço e a anca
e acena a quem por si passa
numa alegria constante.
É tal a sua beleza
que até os passarinhos,
num chilrear cativante,
fazem festa nos seus ninhos.

Quando ela passa,
passa o vira e o corridinho.
Passa a chula e o malhão.
E até o velho fado,
cantiga do coração
no seu olhar se retrata
cheio de beleza e virtude.
E em dias de romaria,
estalam foguetes no ar
e nos andores, nobre altar,
a Senhora da Saúde
e a Senhora da Agonia
sorriem ao seu passar.

Passa o Algarve e o Minho,
os Açores e a Madeira.
Passa Lisboa e Paris
e Nova Iorque e Veneza;
todos os cantos do mundo
onde caminha a firmeza
desta gente aventureira,
rendida à sua beleza.
Na alma carrega a raça
sempre nobre e altaneira;
com a Cruz de Cristo ao peito,
transforma assim, a seu jeito,
a tristeza em brincadeira.

Quando ela passa,
leva a leveza e a harmonia
de quem tanto mundo viu
e tanto calcorreou.
Passam olhos cintilantes
que nos levam por instantes
à casa que nos criou.

Passa o verde, o amarelo,
o vermelho derramado
e o azul, nobre cor.
No requinte e no pudor,
passa a saudade e o amor
aos tempos que já lá vão;
outras modas, outras eras
e outras tantas primaveras
que no seu rosto floriram
cores de eterna mocidade.
Passa o futuro a crescer
na vontade de viver
para lá de qualquer idade.

Quando ela passa,
passa a fadista de garra
que nos seus dedos agarra
as franjas do negro xaile
para nos mostrar quanto vale
a vontade e o querer.
No pranto da sua voz
vão gritos de todos nós,
poetas loucos, por graça.
São versos roucos, sentidos,
dos que o mundo hão-de salvar.
Quando ela passa,
passamos todos, unidos,
pois quando a Glória passa,
é Portugal a passar.


Francisco José Rito

ps: para a Glória de Melo


Sem comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pela visita. Este espaço é seu. Use e abuse, mas com respeito, principalmente por quem nos lê. Francisco