Escrevo, uma vez mais, em jeito de lamento.
Regressar a casa tem sempre o sabor do
aconchego e dos afetos, mas regressar à minha terra exprime-se cada vez mais
pelo desalento de quem aporta um cais que deixou de acontecer.
Não tenho qualquer responsabilidade na
condução das políticas do passado nem do presente da Murtosa, e é público que
não pretendo de todo tê-la no futuro - não é isso o que me move - nem pretendo
com este texto avaliar ou julgar quem as tem. Apenas exerço o meu direito a uma
opinião isenta e livre, conquistado em democracia, sendo essa a sua maior
virtude.
Também não venho apresentar um manifesto de
intenções, mas reafirmo o meu desejo de mudança. Quero ver a minha terra a
despertar do sono amordaçado a que a condenaram. E não basta a alternância
partidária com que habitualmente se tenta superar estas expectativas.
Ambiciono uma mudança mais profunda e
arrojada, que parta das mentalidades, sem se limitar a um mero exercício de
contraditório entre partidos.
Ambiciono-o, e gostaria que outros unissem a
sua voz à minha, num direito que nos assiste. Os murtoseiros têm
obrigação, não de pedir, mas de exigir propostas de governação municipal
ambiciosas, ousadas, modernas.
Exija-se, pois, mais e melhor, a quem anseia
tomar as rédeas administrativas!
A Murtosa é hoje o espelho da apatia das elites
que a governaram, adormecidas pela vaidade de uma história que não souberam preservar.
Como consequência disso, eu, que não sou velho, recordo um passado recente e
sinto que perdemos muito, do pouco que tínhamos.
É urgente despertar, e compete-nos a nós, murtoseiros, exigir políticas e projetos credíveis para esta terra, apresentados com base em cenários coerentes mas atrevidos, alheios a medíocres prazos eleitorais e/ou a vontades próprias.
Não sou retrógrado e tampouco sou apologista
do “bota abaixo” gratuito. Olho ao meu redor e vejo mudanças – as que se
justificam e outras incompreensíveis – mas vejo principalmente, da parte de
quem governa, uma abertura a vozes exteriores, que é inédita e – a meu ver –
muito benéfica. Talvez o reflexo do sangue novo, de mentalidades arejadas.
Espero que assim continue, para bem destas
terras, como espero que a nossa gente apanhe esse comboio e se acostume a ser
mais participativa. Com respeito, mas sem receios, porque só temos legitimidade
para exigir abertura, se estivermos dispostos a entrar.
Não estou aqui a fazer um ato de contrição,
nem retiro um vírgula a tudo o que escrevi no passado. Estou a admitir que noto
algumas diferenças. E se em tempos tive a coragem de apontar o dedo ao que
achava estar mal, tenho agora a obrigação de exaltar o que me parece melhor.
O que se fez no passado foi tapar o sol com a
peneira, em muitos casos. Como resultado, temos muitas rotundas e ciclovias e
caminhos alcatroados, mas estão desertos. Temos as margens da ria emparedadas a
pedra e betão, com um circuito turístico sustentável que poucos usam, o que me
leva a crer que ainda está mal vendido. Temos cais novos mas não temos barcos. Temos
estabelecimentos de restauração de grande qualidade, sem clientes.
Não me considero, de todo, bacoco. Tenho
consciência dos limites de um Concelho pequeno, mas acredito que o pouco,
gerido com inteligência e principalmente com brio, pode multiplicar-se em
grandes resultados.
Mas evoluir não tem de ser sinonimo de
destruir. Concordo com as vantagens da evolução, mas quando esta destrói o que
outros construíram, ou aniquila património histórico e cultural, não a consigo
olhar com bons olhos.
E não, não consigo conformar-me com as obras
que se fizeram na última década, porque a maioria dos murtoseiros não desfruta
delas; porque a maioria dos murtoseiros vive exilada; porque a maioria dos
murtoseiros continua a ter de emigrar, como fizeram os seus antepassados.
Enquanto isso acontecer, tudo o que aqui se
faça, é pouco. Mas entendo que por algum lado terá que se começar; e acredito
que algumas circunstâncias se alteraram; e tenho fé que o futuro me traga ainda
mais surpresas.
A Murtosa tem todas as condições para ser autossuficiente,
basta para isso que se faça o que ainda não foi feito.
E sendo certo que “Roma e Pavia não se
fizeram num dia”, também acredito que “água mole em pedra dura…”
Francisco José Rito
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